quinta-feira, 29 de maio de 2008

O vermelho e o negro para Stendhal

Dizem os cientistas

que a cura da paixão

é não chorar,

é se desapaixonar
.


A falta de serotonina

faz as pernas bambas, a tristeza,

a irritação, o nó na garganta, a insônia,

é o excesso de dopamina.


Estudaram o cérebro de doentes de amor

mostraram-lhes fotos de seus alvos de paixão:

a proteína do prazer ativou-se _

_ o mesmo hormônio da recompensa.


Mas não perguntaram aos amantes rejeitados

se queriam se livrar de sua obsessão

pois a doença da paixão é exatamente isto:

a esperança sempre renovada pelo torturador


o desejo de ter o belo mais uma vez

mesmo que doa, compulsivamente

drogar-se com o outro

nem que sobrem apenas


letras de uma canção.

Nem souberam explicar, os cientistas,

como se desapaixonar.

Esperava receitas, do tipo:


"tome isto toda vez que nele pensar"...

Mas a ciência ainda não encontrou

a fórmula de emendar corações partidos.


Claudia Rogge


'When God made the first
clay model of a human
being, he painted the eyes,
the lips, and the sex.
And then He painted in each
person's name lest the person
should ever forget it. If God
approved of His creation, he
breathed the painted clay-model
into life by signing His own name.'


Sierra Rose Casady and Bianca Leilani Casady


You can leave me
On the corner
Where you found me
I'm not for sale anymore
Not for sale,
Cocorosie

quarta-feira, 28 de maio de 2008

Poetry


it
takes
a lot of
desperation
dissatisfaction
and
disillusion
to
write
a
few
good
poems.
it´s not
for
everybody
either
to
write it
or even to
read
it.
Charles Bukowski

terça-feira, 27 de maio de 2008

sexta-feira, 23 de maio de 2008

Missão Berlengas IV


Todos têm os seus momentos de êxtase, o seu secreto sentido da morte, qualquer coisa que lhes serve de apoio. Visitei cada um dos meus amigos, tentando com os dedos inseguros abrir os seus pequenos cofres fechados. Expus-lhes a minha dor - não, não a dor, mas o sentimento de incompreensível mistério da vida - e pedi-lhes que a examinassem comigo. Alguns procuram os sacerdotes; outros a poesia. Eu refugio-me junto dos meus amigos, vou procurar o meu próprio coração, busco qualquer coisa intacta entre frases e fragmentos, eu a quem não basta a beleza que existe na lua e nas árvores e para quem o contacto de uma pessoa com outra é tudo, mas que nem sequer isso consigo estabelecer, permanentemente imperfeito, frágil e indizivelmente solitário.
Vírginia Woolf - As Ondas
http://ebooks.adelaide.edu.au/w/woolf/virginia/w91w/

Missão Berlengas III


A minha vida é um barco abandonado
A minha vida é um barco abandonado
Infiel, no ermo porto, ao seu destino.
Por que não ergue ferro e segue o atino
De navegar, casado com o seu fado ?
Ah! falta quem o lance ao mar, e alado
Torne seu vulto em velas; peregrino
Frescor de afastamento, no divino
Amplexo da manhã, puro e salgado.
Morto corpo da acção sem vontade
Que o viva, vulto estéril de viver,
Boiando à tona inútil da saudade.
Os limos esverdeiam tua quilha,
O vento embala-te sem te mover,
E é para além do mar a ansiada Ilha.
Fernando Pessoa

Missão Berlengas II


Coisa amar ...
Contar-te longamente as perigosas
coisas do mar.Contar-te o amor ardente
e as ilhas que só há no verbo amar.
Contar-te longamente longamente.
Amor ardente. Amor ardente. E mar.
Contar-te longamente as misteriosas
maravilhas do verbo navegar.
E mar. Amar: as coisas perigosas.
Contar-te longamente que já foi
Num tempo doce coisa amar. E mar.
Contar-te longamente como dói
desembarcar nas ilhas misteriosas.
Contar-te o mar ardente e o verbo amar.
E longamente as coisas perigosas.
Manuel Alegre

Missão Berlengas I

Pequeno espaço poético
dedicado á;

Catarina-Miguel-a-Faroleira,
Henrique-Miguel-o Assadôr-de-Peixe,
Rui-de-Coimbra-e-de-Ribamar-o-Barqueiro,
Tânia-Rato-das-Minhocas,
Diogo-Capitão-de-mares-e-afins,
Nuno-pescador-de-sardinhas-de-conserva

e a todos aqueles que vão contar histórias de naufragos e afins, no cabo Avelar Pessoa:

quarta-feira, 21 de maio de 2008

Missão Berlengas

(resolvi partilhar aqui, o 'chorrilho de letras' do 'naoligoaninguem' que circulam no meu email)
17 de Junho de 1905
É terça-feira de manhã em Berna. O padeiro de dedos tronchudos de Marktgasse discute com uma mulher que ainda não pagou a última conta. Ele gesticula violentamente, enquanto ela, calmamente, mete para o saco mais um pão de centeio que acabou de comprar. à porta da padaria, uma criança corre de patins atrás de uma bola atirada da janela de um primeiro andar, raspando ruidosamente com os patins nas pedras da calçada. No extremo leste de Marktgasse, na esquina com Kramgasse, um homem e uma mulher estão abraçados na sombra de uma arcada. Passam dois homens por eles de jornal debaixo do braço. Trezentos metros mais a sul, uma ave sobrevoa o Aare em voo planado.
O mundo pára.
A boca do padeiro detem-se a meio de uma frase. A criança parece flutuar a meio de um impulso, a bola fica suspensa no ar. O homem e a mulher são duas estátuas sobre a arcada. Os dois homens são estátuas também, e a sua conversa interrompida como quando se levanta a agulha da vitrola. O pássaro pára de voar e queda-se imóvel sobre o rio, qual adereço suspenso sobre um palco.
Um microssegundo depois, o mundo entra de novo em movimento.
O padeiro continua a arengar como se nada se tivesse passado. Do mesmo modo, a criança volta a correr atrás da bola. O homem e a mulher abraçam-se ainda mais. Os dois homens continuam a sua discussão sobre a subida dos preços da carne. O pássaro bate as asas e continua a descrever o seu arco alado sobre o Aare.
Daí a uns minutos, o mundo pára outra vez. E logo recomeça. Pára. E recomeça.
Mas que mundo será este? Neste mundo o tempo não é contínuo. Neste mundo o tempo é descontínuo. O tempo é um feixe de fibras nervosas: aparentemente contínuas à distância, disjuntivas, porém, quando examinadas de perto, com espaços microscópicos entre elas. Os impulsos nervosos percorrem um segmento de tempo, param abruptamente, fazem uma pausa, saltam sobre o vácuo e continuam no segmento seguinte.
As zonas de descontinuidade são tão minúsculas que um único segundo teria de ser ampliado e dissecado em mil partículas, e cada partícula em outras mil, para se poder detectar uma partícula de tempo em falta. As zonas de descontinuidade são tão minúsculas que os espaços existentes entre os segmentos são praticamente imperceptíveis. Depois de cada recomeço do tempo, o novo mundo parece exactamente igual ao anterior. As posições e os movimentos das nuvens parecem exactamente os mesmos, tal como as trajectórias dos pássaros, o fluir das conversas, os pensamentos.
Porém, os segmentos de tempo encaixam-se de forma quase perfeita, mas não completamente perfeita. De vez em quando há alguns desfasamentos pequeníssimos. Por exemplo, nesta terça-feira, em Berna, um rapaz e uma rapariga de vinte e poucos anos estão encostados a um candeeiro em Gerberngasse. Conheceram-se há um mês. Ele ama-a perdidamente, mas já sofreu muito por uma mulher que o deixou sem qualquer explicação, e tem medo do amor. Precisa de ter a certeza de que esta mulher o ama. Estuda-lhe o rosto, tenta desvendar em silência os seus verdadeiros sentimentos, procura o mais pequeno indício, o mais leve arquear de sobrancelhas, o mais ténue rubor nas suas faces, uma lágrima nos seus olhos.
Ela na verdade também o ama, mas não consegue traduzir em palavras esse amor. Em vez disso, sorri para ele, inconsciente dos seus receios. Enquanto os dois continuam imóveis à luz do candeeiro, o tempo pára e retoma o seu curso. Depois do recomeço, a inclinação das suas cabeças é precisamente a mesma, o pulsar dos seus corações não sofreu alteração. Porém, algures nos recantos mais recônditos da mente da rapariga, surgiu um pensamento sombrio que não estava lá anteriormente. A rapariga segue o pensamento até ao inconsciente e, ao fazê-lo, uma vaga expressão de ausência ensombra-lhe o sorriso. Brevíssima, esta hesitação teria passado normalmente despercebida, excepto à mais minuciosa observação. No entanto, o rapaz, em toda a sua ansiedade, reparou nela e tomou-a pelo tal indício que procurava. Então, diz à rapariga que não pode voltar a vê-la, regressa ao seu pequeno apartamento de Zeughausgasse, e resolve mudar-se para Basle, para ir trabalhar no banco do tio. A rapariga desencosta-se do tal candeeiro de Gerberngasse e volta a pé para casa, devagar, procurando entender por que razão o rapaz não a amava.
Alan Lightman,
Os sonhos de Einstein

Para ler, repetindo os movimentos
Da mão direita à outra do mesmo homem vai por vezes uma distância obscura. Não se trata de uma parte esconder intenções ou até acções. É outra coisa.
Quando, para receberes alguém, abres os braços, a referida distância aumenta e a mão, em cada ponta, assinala um certo modo com que o teu corpo se dispersa. Quando o abraço se concretiza e nas costas do outro as mãos finalmente se reencontram, formalizam um símbolo ao mesmo tempo desolador e esperançoso; é que só nas costas do outro as tuas partes se unem com uma energia digna de admiração. Experimenta, sem outro corpo no meio, unir com força, com violência até, as tuas mãos, e verás o ridículo, perceberás a diferença de intensidade.
Mas por vezes - como bem sabes - não há outro corpo.
Gonçalo M. Tavares,
Sobre o medo

quarta-feira, 14 de maio de 2008

segunda-feira, 5 de maio de 2008

Pedido comercial

à http://www.bosforodealmasy.blogspot.com/

Quando eu era criança gostava muito de olhar as nuvens.Havia umas redondinhas muito luminosas que se amontoavam por vastas áreas do azul do céu que os meus olhos percorriam encantados. Uma vez perguntei: o que é aquilo? São os anjinhos, responderam-me, e eu acreditei porque era verdade.
Ana Hatherly

sem titulo


que língua falas quando como um sussurro
me obrigas a respirar palavras
com dicção de pedra
quando as nuvens não sabem dos pássaros
não há instantes na tua realidade
só ficam gritos a esvoaçar num céu líquido
e guardas o sentido com a avidez do vazio
surripada á Alice